Violência nas ruas ecoa nas redes sociais; caso em Natal é exemplo

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

De Sérgio Henrique Santos, especial
para O Poti
O relato que ilustra essa página de O
Poti/Diário de Natal, logo ao lado, foi
escrito pela jornalista Zhamara
Mettuza. Ela usou uma rede social
para compartilhar com seus
seguidores um drama que vivenciou
na noite fria de terça-feira, 13 de
fevereiro. Naquela noite Zhamara diz
que "nasceu de novo". Ela chegou do
trabalho, tomou banho e levou sua
cachorrinha poodle para passear,
como faz costumeiramente. Conta a
vítima: "Não costumava levar o
celular, mas um amigo ficou de ligar e
atendi o telefone em uma área
residencial, próximo à esquina de
uma rua perto da minha casa. Estava
distraída. De repente percebi aquele
cara com capacete. Alto, magro, de
moletom e calça jeans. Ele parou a
moto do meu lado".
Durou apenas dois ou três minutos,
mas foi uma ação violenta. O homem
agiu com rispidez, abordou Zhamara
insistindo que queria dinheiro, celular
e tudo mais que ela tivesse. Não
gritava, mas era violento. Quem gritou
foi Zhamara. Gritou muito. A
cachorrinha latia sem parar. O
homem ficou assustado. A arma
falhou. A poodle não parava de latir.
Algumas pessoas observavam a cena,
impossibilitadas de agir sob pena de
tomar um tiro no peito ou na testa.
Acuado, o assaltante agrediu
Zhamara. Atirou uma, duas, três
vezes. "Deu três coronhadas na
minha cabeça. Pingava sangue na
minha mão. Ele parecia aflito com os
latidos dela [cachorrinha]. Eu também
estava atônita. Sabia do perigo, mas
não parava de gritar feito uma louca",
conta a jornalista, que ao fim
entregou o celular e viu seu algoz
dobrar a esquina com a moto.
Conforme relatou no Twitter,
Zhamara foi acudida e voltou pra
casa.
Ser assaltado parece algo corriqueiro.
A forma violenta da ocorrência com
Zhamara Metusa não. Após perceber
que sangrava muito por causa da
coronhada na cabeça, os familiares a
levaram para o hospital. Tomou
quatro pontos. Apesar do susto, ela
conta que assim que pôde descreveu
tudo no Twitter. Foi o desabafo,
seguido de centenas de recados de
seus amigos, lhe prestando
solidariedade. As redes sociais hoje se
tornaram um reduto de informações
prestadas por pessoas conectadas, e
não poderia deixar de ser também
um grito de socorro de problemas
sociais como a violência urbana de
roubos, assaltos e homicídios que
assustam a população.
Os números são subnotificados, mas
ultimamente, o noticiário policial da
capital e de várias cidades do interior
do Rio Grande do Norte ganhou
novos depoimentos. Fuga de quase
50 pessoas no sistema penitenciário,
mais de 30 assaltos a ônibus em um
mês, dezenas de carros roubados,
roubos a agências bancárias,
shoppings, supermercados, lotéricas.
Tudo se viu e tudo se leu sobre nas
redes sociais mais conhecidas e
utilizadas: Twitter, Facebook, Orkut.
Fontes antes não tidas como oficiais
agora ganham status de depoimentos
verdadeiros. Os sites se tornaram tão
úteis (ou inúteis, quando o relato da
ocorrência não passa de boato) que
tanto a imprensa escrita, falada e
televisionada se utiliza deles, assim
como o fazem as autoridades
policiais. Ir à frente do computador,
relatar furtos e roubo de carros,
assaltos, fuga em massa de delegacias
e presídios, batidas e acidentes de
trânsito também se tornou algo
comum.
A insegurança seria maior que a
realidade? "Não", diz a professora
Ana Cecília Aragão Gomes, que
leciona Opinião Pública e Mídia no
curso de Comunicação Social da
Universidade Potiguar (UnP) e acha
que o excesso de relatos vistos nas
redes sociais após algum
acontecimento de insegurança na
cidade é um fenômeno novo e que
modifica a produção de sentido das
informações. "São pessoas comuns
noticiando o que acontece em seu
cotidiano. No momento em que se
começa a ver e ouvir tudo aquilo, os
relatos de violência ganham também
as páginas dos jornais tradicionais e
passam a demonstrar que cresce o
sentimento de insegurança entre as
pessoas. Uma insegurança construída
a partir de mensagens, discursos,
narrativas de um meio - a internet,
que tem reflexo no mundo real",
explica.
Visibilidade
Os dados oficiais nem sempre
condizem com a quantidade de
pessoas que, após uma ondade
assaltos, por exemplo, conta a
situação que vivenciaram nas redes
sociais da internet. Isso se explica por
dois fatores: nem todo mundo
registra a ocorrência na Polícia Civil e
os veículos de comunicação só
noticiam após apurar a informação.
"A violência é inerente ao ser
humano. Com o aumento da
quantidade de relatos percebemos a
espetacularização da violência, que
está presente em todas as classes
sociais. Com essa visibilidade grande
da violência, as pessoas procuram se
proteger cada vez mais. Por isso
cresce o número de pessoas que
instalam cercas elétricas, câmeras de
vigilância. Mais vigiada, a pessoa se
sente também mais vigilante. É o
impacto de algo que começa nas
redes sociais, mas que repercute no
cotidiano", opina Cecília.
A jornalista Zhamara Mettuza, que
abriu essa reportagem, confessa que
sempre participou de campanhas
iniciadas nas redes sociais com intuito
de denunciar o aumento da
insegurança no Estado, embora
nunca houvesse sido vítima. "A
violência cresceu. E não é por causa
do uso dasredes sociais, onde mais
pessoas podem contar o que viveram,
que percebemos isso. A cidade está
mais violenta sim. O conjunto onde
eu moro era famoso por reunir
pessoas na calçada e quase não haver
relatos de assaltos. Hoje tomo
conhecimento de assalto a várias
pessoas aqui perto de casa toda
semana. Não se pode mais colocar
cadeiras de balanço na porta de casa.
A sociedade tem que se mobilizar.
Exigir segurança. Algo urgente precisa
ser feito", alerta.
Dimensão real da insegurança
Ter a dimensão real da insegurança
que assola a população é algo que
divide opiniões no que se refere à
dimensão dos relatos, mas que
ressaltam o novo papel das redes
sociais como uma fonte a mais no
mundo da comunicação. Guardadas
as proporções, seria como a História
Oral para os historiadores, que se
tornou uma alternativa de registro do
passado diferente da documentação
oficial. O site Via Certa Natal, criado há
um ano e que utiliza o Twitter para
colocar informações sobre o trânsito
na capital, costumeiramente posta
ocorrências de roubo a carros,
batidas e assaltos no transporte
coletivo. "Se a violência aumentou ou
não? Difícil de responder. O fato é
que colocamos apenas informações
após tomar o cuidado de checar se
elas são verdadeiras. Por isso, como
publicamos muitas ocorrências,
acredito sim, que a violência
aumentou mesmo", afirma Hudson
Silvestre, idealizador do site.
Checar a informação é algo que, para
a Polícia Militar, é fundamental. Desde
o dia 8 está em ação um plano de
segurança chamado Metrópole
Segura, a intensificação do
policiamento ostensivo depois a onda
de crimes como os assaltos,
registrados entre janeiro e fevereiro.
"As informações postadas em
qualquer meio de comunicação
ajudam o sistema de segurança
pública a mapear onde existem
ocorrências e adotar medidas para
inibir esse tipo de ação. O que traz
transtornos e prejuízos são as
ocorrências fictícias. Os trotes virtuais
prejudicam nosso trabalho. E é ruim
para a população porque aumenta a
sensação de insegurança. Em vez de
um serviço, essas pessoas que usam
a internet para dizer falsas
ocorrências fazem um desserviço",
opina o comandante da corporação,
coronel Francisco Canindé de Araújo.
A professora Ana Cecília Aragão
ressalta que os boatos são
informações especulativas, sem
apuração. "A imprensa apura a
notícia, só publica depois de checar a
veracidade do fato, mas é um recorte
da realidade, um espelho do real. As
redes sociais são um 'outro olhar' das
notícias, ampliam e rompem aquele
modelo comunicacional tradicional do
emissore do receptor. Elas geram
pauta nas redações, mas é preciso
observar como o fato será levado ao
produto final. Ai se incluem fatores
como interesses dos veículos, e
outros tipos de interesses como o
perfil editorial do jornal, a
manipulação política da informação e
a força dos anunciantes", cita como
exemplos.
Fenômeno duradouro
As redes sociais são democráticas, diz
a professora Ana Cecília Aragão, e
quebram a relação de poder e visão
de grupo das pessoas. Como
qualquer um pode ter acesso, a
estrutura do poder midiático se
pulveriza com o excesso de notas,
comentários e postagens sobre um
mesmo fato, tanto nas redes sociais,
mais imediatistas, quanto nos blogs,
mais reflexivos. "Isso é duradouro e
cada vez mais reforça o poder da
internet, inclusive demonstrando a
capacidade de mobilização entre as
pessoas. Ao mesmo tempo, ela é
ruim quando deixa transparecer a
violência dos discursos. Quando se
observa, por exemplo, um excesso de
pessoas denegrindo a imagem de
alguém como o ex-presidente Lula,
ou o preconceito contra nordestinos.
É uma violência que existe mas que
não era vista. Violência pesada,
psicológica".
O excesso de visibilidade também
tem outro viés: a superexposição da
vida particular dos usuários das redes
sociais. "É a publicização do privado.
Algumas pessoas acham que estando
na internet, estão na casa delas.
Dizem o que querem, falam o que
pensam. Não percebem que a
internet é pública. Tudo que é dito ou
escrito ali repercute publicamente",
destaca a especialista.

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